Convidamos Márcia Soares do Fundo Vale e Vivian Rubia do ICE para trazer a perspectiva dos financiadores de projetos sobre como enxergam a gestão dos projetos executados e também contar sobre como eles mesmos executam a gestão dos seus projetos. Este episódio encerra uma Jornada incrível de 18 gravações com participações especialíssimas de pessoas e organizações que estão fazendo existir e acontecer o campo de impacto socioambiental no Brasil.
Este é o último episódio da série gravada a partir dos desafios que gestores de projetos de negócios socioambientais brasileiros vivenciam nas suas instituições. Estes gestores compartilharam seus desafios na Jornada PQPS! discutindo suas Perguntas e Questionamentos sobre Projetos Socioambientais. Estes casos foram desenvolvidos e gravados pela equipe da Rede Tekoha. Apoiou na produção dos podcasts a Aupa; na seleção dos casos a ponteAponte, e os recursos vieram da chamada Elos de Impacto realizada pelo ICE.
Transcrição do episódio
Apresentação:
Rede Tekoha e Instituto de cidadania empresarial apresentam:
PQPS Perguntas e Questionamentos Sobre Projetos Socioambientais.
Uma conversa aberta com quem trabalha com projetos no campo de desenvolvimento socioambiental.
Márcio
Bom dia, boa tarde, boa noite.
Seja muito bem-vinda, seja muito bem-vindo para a nossa conversa na jornada PQPS Talks, Perguntas e Questionamentos sobre Projetos Socioambientais. Eu sou o Márcio Pires, falando pela Rede Tekoha, e esta conversa é parte de uma série de papos com quem atua na gestão de projetos socioambientais no Brasil. Vamos juntos mais uma vez, mergulhar nas vivências de quem faz acontecer o campo de impacto socioambiental. Hoje nós temos o segundo dos nossos encontros de encerramento dessa jornada, novamente em um formato diferente sem ser uma entrevista focada em uma única organização participante, e um formato um pouco mais longo. É outra conversa mais que especial, porque hoje nós vamos receber os viabilizadores da jornada PQPS! Nesta edição especial 2020/2021. A jornada só foi possível porque a Tekoha foi contemplada na chamada Elos de Impacto, incubação e aceleração. A chamada disponibilizou recursos para viabilizar este projeto em parceria com o Instituto de Cidadania Empresarial (ICE) e o Fundo Vale. O fundo Vale já completou dez anos de atividades e é um fundo de fomento e investimento que foi criado para gerar impacto socioambiental positivo. A ideia é potencializar uma economia mais sustentável, justa e inclusiva. Nestes dez anos o fundo já investiu mais de cento e trinta milhões de apoiando desde de organizações da sociedade civil até pequenos empreendedores, passando por comunidades e povos tradicionais ribeirinhos, programa de aceleração de negócio de impacto, enfim, toda uma gama de atuação. Já o Instituto de Cidadania Empresarial (ICE) atua mais de vinte anos no fomento da inovação social e hoje o ICE está dedicado ao fortalecimento do ecossistema de investimentos e negócio de impacto no Brasil e a perspectiva com que o Instituto trabalha é de que os negócios de impacto possam contribuir com os grandes desafios socioambiental do país e contribuir ainda para uma economia que colocam um impacto positivo no centro de todas as decisões. Por isso tudo que nós estamos hoje conversando com os representantes das duas organizações. O nosso primeiro olá vai para a Márcia Soares que atua como líder de parcerias e redes do Fundo Vale. Tudo bom com você Márcia? Fale um pouco sobre você.
Márcia
Olá Márcio, tudo bom. Primeiramente obrigada a equipe Tekoha pelo convite. É um prazer falar sobre projetos socioambientais. Eu sou graduada em comunicação social e tenho mestrado nesta área, mas minha trajetória toda de atual profissional foi na área socioambiental, com projetos de meio ambiente, onde tenho trabalha há mais de vinte anos, inicialmente trabalhei muito tempo com comunicação corporativa, com relações institucionais, mas com o passar dos anos eu fui migrando para entender estes processos de colaboração e rede neste campo socioambiental. E no Fundo Vale eu estou há dez anos e hoje eu lidero a área de parcerias e rede do Fundo Vale. O Fundo Vale foi criado há dez anos pela mineradora Vale e é um dos veículos do investimento social voluntário da empresa, na verdade ele foi criado para ser uma contribuição adicional da Vale para a agenda de sustentabilidade. No ano passado o Fundo Vale completa dez anos de atuação e se repensa, reavalia seu histórico e traça suas estratégias para os próximos dez anos.
Márcio
Obrigado Marcia.
A gente também tem em nossa roda a Vivian Rubia que atua como coordenadora de programas do ICE. Tudo bem contigo Vivian, conte para gente um pouco sobre você.
Vivian
Olá Márcio. Eu agradeço muito o convite, estou super feliz de estar aqui. Eu represento o ICE que é o Instituto de Cidadania Empresarial. Eu sou formada em comunicação e também mestrado em empreendedorismo social, atuo há mais de dez anos em várias organizações, atuando especialmente nas áreas de comunicação, captação de recursos e projetos. No ICE eu coordeno duas iniciativas. Uma é o Elos de Impacto e a outra é o Fórum de Investimento e Negócio de impacto. É super importante a gente posicionar o papel do ICE nesse fortalecimento no campo dos investimentos e negócio de impacto, a gente tem feito isso por meio de uma séries de iniciativas, tanto iniciativas mais voltadas para advocacy com a aliança pelo investimentos e negócios de impactos, iniciativas junto à academia, eu acho dos aspectos super importantes que a gente tem olhado e trazido como referência para o campo dos investimentos e negócios de impactos, é um olhar sobre as organizações que dão suporte e atuam para que a gente tenha mais negócio e um ambiente mais propício para os investimentos, dentro disso essa parceria aqui, a minha presença aqui também representa uma das iniciativas que nós fizemos dentro do Elos de Impacto, é esse nosso programa que tem este braço de apoio às organizações dinamizadoras, que foi uma chamada que fizemos no ano passado justamente para viabilizar projetos de organizações que de alguma forma fomentam negócios e que dão suporte para quem empreende e precisam estruturar suas iniciativas. Eu vejo com bons olhos a iniciativa da Tekoha de olhar do ponto de vista de gestão de projetos e estamos super feliz de estar aqui apoiando e compartilhando a nossa experiência junto com todos vocês.
Márcio
A gente também está super feliz de estar com todos vocês aqui.
Voltando para a Márcia. A primeira questão que eu quero que você traga para a nossa conversa Márcia é sobre a proximidade que o Fundo Vale tem em relação aos projetos apoiados. A gente sabe que o Fundo tem como proposta estar junto com as pessoas e estabelecer um relacionamento próximo com as organizações, com os negócios que estão no campo social, o processo de escuta, discursão e aprendizado. Então quero saber de você como isso se reflete no dia a dia da gestão das iniciativas que recebem os aportes do Fundo.
Márcia
No ano passado o Fundo Vale redefine a sua teoria de mudança e toma uma decisão de focar nos negócios e investimentos de impacto como uma estratégia de atuação para alcançar a sustentabilidade socioambiental. Então a gente tem atuado muito com organizações do campo socioambiental muito com projetos produtivos e a gente acredita muito que a melhor forma de aprendizado é de fato estar em campo, estar próximo desses projetos, destas parcerias que a gente estabelece. Então somos um financiador que gosta de participar das ações, de ter um diálogo contínuo com estes parceiros. Mesmo durante o nosso processo de gestão de parcerias deixamos bastante claro que este é o modelo de acompanhamento de projetos para além dos relatórios formais que todos temos que receber. A gente gosta de estabelecer uma relação de confiança com estes projetos e com estes parceiros. Uma confiança que gera troca, que gera colaboração, acreditamos muito na criação de espaço de diálogo, inclusive gostamos de promover momentos de colaboração entre os diferentes parceiros, porque achamos que este é o caminho para a gente viabilizar soluções para os problemas socioambientais deste país. A gente acha que não tem solução simples para problemas complexos. É fundamental ter diferentes olhares, diferentes perfis de parceiros nesta busca de soluções socioambientais e nada melhor de quem está no chão, de quem está sofrendo e vivendo as questões socioambientais para entender os caminhos possíveis, esta é a lógica de atuação do Fundo Vale no acompanhamento destes projetos, esta proximidade, esta escuta ativa sempre que possível.
Márcio
Ao longo destes dez anos de atuação do Fundo Vale vocês conseguem enxergar uma mudança na maneira de gerir projetos por parte das organizações e dos negócios que são apoiados? E quais são estas mudanças, se é que elas existem?
Márcia
Nestes dez anos, sim, a gente percebe uma trajetória de amadurecimento das organizações socioambientais nas gestões destes projetos e também percebemos um amadurecimento e uma busca por melhoria de gestão dos próprios negócios de impacto socioambiental ou das cooperativas, das associações de produtores, por exemplo, neste caminho. O Fundo Vale no seu olhar de parceria ele sempre tenta buscar um apoio que possibilite que esses negócios, esses parceiros consigam melhorar suas gestões institucionais. A gente acredita que é fundamental ter ferramentas, ter processos muito claros, mas é muito importante também ter uma flexibilidade na gestão, quando a gente lida com questões socioambientais estamos à mercê e venerável a muitas intercorrências ao longo da implementação destes projetos, que muitas vezes fogem ao controle, e por isso que nesta relação entre o Fundo Vale e os parceiros a gente tenta ter uma flexibilidade de forma a acomodar mudanças de rotas, de planejamento e por isso que é tão importante a gente estar muito próximo para entender as motivações desses processos de gestão. Uma coisa que tem se destacado muito, em minha opinião, nos últimos anos é o uso da tecnologia nas gestões dos projetos, está muito claro o quanto a internet veio para influenciar positivamente os processos de gestão, seja melhorando a comunicação entre as organizações facilitando e agilizando processo mais burocráticos, mesmo nas áreas rurais onde ainda tem pouco acesso às tecnologias, mesmo nas áreas rurais você vê hoje produtores, familiares e extrativista usando de recursos tecnológicos, usando ferramentas eletrônicas para melhorar a sua gestão, para melhorar seu acesso ao mercado e sua comunicação. Então eu acho que a tecnologia veio para mudar e com o advento da pandemia nesse processo a gente foi empurrado para a tecnologia de uma forma muito acelerada, acredito que temos de usar o potencial de forma positiva já que estamos em um mundo onde todos se comunicam e se conectam de forma virtual e eletrônica.
Márcio
A gente costuma sempre falar que oitenta por cento do trabalho do gestor de projetos é baseado em comunicação. Seguindo baseado no que você acabou de falar, quando a jornada PQPS! Foi desenhado pela equipe da Tekoha, ela foi baseada na visão que é muito comum que os gestores de projetos acreditam que uma capacitação técnica das suas equipes com uma metodologia, com um conjunto de boas práticas sobre gestão vai resolver ou parte ou até todos os problemas que acontecem na gestão do negócio ou projeto. Muitas vezes a gente vê que os gestores realmente conhecem as ferramentas, as técnicas que são abordadas nos workshops, mas o que acontece em vários momentos é que o problema que surge na gestão, muitas vezes não estão relacionadas as ferramentas e as técnicas, mas também as questões comportamentais ou sobre o entendimento do problema socioambiental que está sendo tratado. Vocês percebem isso também no dia a dia junto aos projetos apoiados? Como vocês lidam com isso?
Márcia
De fato, é óbvio que ferramentas e técnicas vão ajudar, mas são ferramentas, eu acho que a questão principal está na intencionalidade do que você quer fazer e do problema que você quer solucionar. No final do dia a gente está falando de gestão de pessoas. Quando você fala de um projeto ou de um negócio socioambiental nós estamos falando de pessoas, estamos falando de mudar comportamentos, estamos falando de um ambiente que é muito influenciado por vários componentes, políticos, territoriais, enfim, que necessita de uma análise de contexto que não é uma ferramenta que vai te dar a solução de tudo. Então a gente valoriza muito isso na gestão de projeto e na gestão de parcerias do Fundo Vale quando a gente estabelece essa interlocução, essa relação com os parceiros ela tem que que ser muito baseada na empatia em entender o que está acontecendo do outro lado, na transparência da comunicação de você ser muito claro nos objetivos que você quer alcançar e no que você está fazendo para chegar naquele lugar. É fundamental esse olhar de pessoas diferentes, pois quanto maior a diversidade, que está tão na moda, todo mundo falando de inclusão e diversidade, mas mais do que tudo, ela é fundamental para resolver problemas complexos, porque esses diferentes olhares, diferentes pontos de vistas é o que vai trazer de fato diferentes possibilidades de solução quando a gente enfrenta problemas socioambientais e na implementação destes projetos, outra coisa que a gente acredita muito é no engajamento das pessoas naquela temática, naquele problema. Engajamento não se resolve com técnica ou com ferramenta e sim se resolve com atenção, com empatia, com você dar voz para as pessoas e elas terem espaços para se posicionar e a gente acredita que nas gestões dos projetos de maior sucesso foram aqueles que tinham as equipes mais engajadas e a que mais acreditavam naquela proposta que estava sendo colocada. Acreditamos que esse é um caminho bastante importante para quem lida com gestão de projetos.
Márcio
Muito bom Márcia.
Vivian queria escutar sobre você e sobre a sua posição de coordenadora de programas no ICE. O que você escuta das equipes de gestão de projetos apoiados pelo ICE sobre a existência ou sobre a inexistência de espaço onde seja possível discutir anseios? Como são estes espaços? Se eles existem, onde a gente pode construir soluções sobre problemas com outras organizações do campo, soluções baseadas nas experiências vividas que muitas vezes são comuns às várias organizações. Dá para a gente ver uma conexão entre a existência desses espaços e os sucessos dos projetos geridos pelas equipes?
Vivian
O ponto importante na questão da atuação em rede e de espaço para a troca de experiência é quando olhamos para os projetos que o ICE de alguma forma está envolvido, é super importante entender este lugar que o ICE tem assumido. O ICE se coloca muito como uma organização articuladora e mobilizadora de vários temas relacionados às agendas dos investimentos de negócios de impacto. Então está muito em nosso jeito de fazer. Dificilmente a gente apoia somente uma organização sem que de alguma maneira se ela não esteja relacionada a um objetivo que seja comum, tanto do ICE quanto do próprio campo. O primeiro ponto é: a gente ouve, a gente percebe que faltam muitos desses espaços. Isso tem estado em nossa agenda, desde que a gente começou a atuar nessa agenda de impacto, temos percebido cada vez mais a importância dessa colaboração, temos fomentado isso, temos nos colocado muito nesse papel de fomentar e articular, mas achamos que ainda temos muitos passos para serem dados, temos muitas agendas comuns que ainda poderiam ser potencializadas. Uma experiência que vale a pena ser comentada, que inclusive o Fundo Vale é uma das organizações que está super envolvida é o FIIMP, que é um dos exemplos que a gente tem feito alguns experimentos práticos de discutir e de ter esses espaços para a troca de experiências, isso de alguma forma enriquece todas as organizações que estão envolvidas. No caso do FIIMP que é Fundações e Institutos de Impacto. Ele foi uma iniciativa, que na verdade nasceu em 2016 dentro de um lab aliança pelos investimentos em negócios de impacto, na ocasião tinha uma série de eventos justamente para fomentar e olhando para os avanços que o campo precisaria dar para os próximos cinco anos, entendeu como que várias organizações poderiam trabalhar coletivamente. E uns dos desafios que colocaram naquele momento era a importância de se olhar para os institutos e fundações para que eles pudessem investir e experimentar um investimento na área de negócio de impacto e experimentar alguns instrumentos de impacto social. Foi justamente nesse momento que surgiu a oportunidade para vários institutos e fundações e foi criado o FIIMP que foi uma grande iniciativa, um grupo que se propôs juntos a aprender como eles poderiam melhor potencializar e fazer co investimentos. Naquele momento os institutos e fundações também tinham dúvidas. Como a gente faz investimentos de impacto? Será que é melhor a gente investir diretamente no negócio? Será que é melhor a gente escolher fazer via algum intermediário do campo? Que tipo de instrumento financeiro a gente pode aprender mais? O que é permitido, eu sou uma fundação, será que este instrumento faz sentido para mim? Era um desafio comum a todas aquelas organizações, a gente sentia que tinha uma oportunidade para construir esse espaço de troca. A Márcia pode até me complementar, porque ela está super envolvida. Eu acho que este grupo desde de 2016 mobilizou recursos de mais de vinte organizações, na última edição acho que tivemos muito mais que vinte. O grupo inicial era de vinte e duas fundações e institutos conectados com essa agenda. O último grupo que foi o FIIMP2, que teve duas rodadas, mobilizou mais de um milhão de reais para investir em diversas iniciativas do campo. Para mim ficou muito claro que é importante que tenha estes espaços para se discutir estes anseios baseados nas experiências, mas do que isto, é importante que este grupo consiga construir, o que foi feito no FIIMP, uma agenda comum, ações pragmáticas que tenha também este foco, um modelo de governança que de alguma forma permita essa troca de experiência na construção participativa e espaço de troca e compartilhamento do conhecimento. Então o espaço em si ele pode ser o propiciador dessas trocas e contribuir para os projetos alcancem resultados que individualmente talvez eles não conseguiriam alcançar.
Márcio
Vou aproveitar o gancho que você deixou Vivian para perguntar para a Márcia que também está em uma organização envolvida no FIIMP, no grupo da fundações e institutos de impacto. Márcia, você tem algum exemplo para nos dar sobre uma situação em que colaboração entre os gestores dos projetos ou conhecimento compartilhado sobre gestão acabou gerando melhorias significativas?
Márcia
Então, com a Vivian disse, esse grupo FIIMP foi uma grande experiência de aprendizado coletivo entre institutos e fundações que queriam trabalhar com negócios e investimentos de impacto e ainda tinham muitas dúvidas. O caminho que este grupo tomou foi de aprender fazendo, que foi a melhor forma e o melhor caminho possível. Então, não só a gente resolveu estudar sobre os temas, estudar questões legais, estudar os melhores mecanismos financeiros, mas a gente juntou recursos para de fato apoiar iniciativas intermediárias do ecossistema de impacto que estavam trabalhando com estes mecanismos financeiros. E de fato este foi o melhor aprendizado. Acredito que todos os institutos e fundações que participaram desta experiência conseguiram levar para dentro de casa. A gente tem exemplo de projetos e de iniciativas que surgiram após esta vivência do FIIMP, onde começam trabalhando com seus iguais, seus pares, você consegue dividir suas angústias, entender o que pode dar certo e o que não pode e o que tem mais sinergia com seu modelo de trabalho ou não. Ali cada instituto tinha agendas diferentes, interesses diferentes, mas com a proposta de aprender juntos abriu mão de alguma forma de suas agendas e interesses institucionais específicos para trabalhar no aprendizado coletivo e isso foi muito rico. Outros exemplos de aprendizado coletivo ou de ações coletivas que ajudam a potencializar os negócios de impactos, tem um programa de aceleração que a gente apoia que é o programa da plataforma Parceiros pela Amazônia (PPA) que no ano passado eles se juntaram a um laboratório de logística e comercialização que vinha sendo conduzido por uma outra organização que é Climate Ventures para pensar como os negócios que estavam sendo acelerados, eram quinze negócios, como que eles poderiam superar a crise econômica que a pandemia trouxe para estes negócios da Amazônia, e eles decidiram juntos pensar em uma ação coletiva e conseguiram construir uma campanha junto com o mercado livre, que se chamou Amazônia em Casa Floresta em Pé, que é uma campanha onde eles se organizaram, muitos destes negócios são produtos alimentares da Amazônia, produtos da floresta, eles se organizaram com o mercado livre para fazer uma página específica de vendas para enviar juntos estes produtos da região norte até o centro de distribuição do mercado livre e isso gerou uma riqueza, o aumento de vendas por parte destes negócios e outros resultados bastantes positivos, que individualmente seria impossível deles conseguirem, porque seria muito mais difícil um negócio pequeno conseguir abrir um espaço dentro do mercado livre da forma que conseguiram. Então, a ação coletiva foi o que possibilitou de fato um alcance maior de escala, conseguiu estruturar soluções para que estes negócios superassem o momento da pandemia.
Márcio
Você levantou um bom gancho, porque a gente fez as entrevistas, tanto com a Climate Ventures quanto com o Instituto Auá, as duas entrevistas estão na plataforma da Aupa. www.aupa.com .br/pqps. Para quem ainda não escutou, são dois episódios que chamamos de irmãos do podcast que ficaram bem interessantes.
E aqui no PQPS! Talks a gente sempre terminou cada uma das entrevistas, com as organizações participantes, perguntando sobre algum desafio que estavam “pegando” para elas. Então para fechar eu também queria saber de vocês duas. Como vocês mesmos lidam com aquele momento que respira fundo e pensam “pqps”? Como vocês lidam com os projetos socioambientais o tempo todo, uma como líder de parcerias, gerenciando todo tipo de stakeholders, a outra coordenando programas, então eu queria saber de vocês, quais são as principais perguntas e questionamentos que aparecem para vocês e o que tem de mais desafiador?
Eu queria começar pela Márcia, existe técnica, tem framework que dê jeito de lidar com tudo isso? Como você faz com todas essas partes interessadas, como você trabalha como líder de parcerias e redes?
Márcia
Aqui do lado do Fundo Vale o grande desafio que temos enfrentado é pensar na questão da escala, a gente que trabalha com os problemas socioambientais, a gente vê um aumento do desmatamento ilegal, vemos o aumento da pressão sobre os recursos naturais, vemos o tema de mudanças climáticas com muitas dificuldades de avançar e a gente fica se perguntando, como que a gente consegue por meio das nossas parcerias, com que parceiros vamos construir essas relações e construir estes projetos de forma a alcançar a escala necessária que o planeta está pedindo. Este para nós é o grande dilema que eu acordo todos os dias pensando, como de fato as nossas parcerias vão ter capacidade de impactar ainda mais positivamente as suas agendas. E de fato não tem técnica que dê jeito, claro que temos um trabalho intenso de procurar parcerias estratégicas e parceiros que de fato estejam fazendo a mudança que precisamos. O que a gente tem tentado é buscar construir projetos mais estruturantes que sirvam de modelo, que tenham potencial para ser replicado em outras regiões ou que sejam projetos que coletivamente conseguem uma escala maior do que se estivessem atuando sozinhos. Isso só é possível a partir de muita escuta, de muita interação com quem está atuando com estas temáticas para entender quem é quem nesse jogo da conservação ambiental, da sustentabilidade e tentar identificar quem tem o alinhamento de propósito institucional que é fundamental para o estabelecimento de parcerias e para depois a gente ver as técnicas e quais modelos a gente pode usar para avançar nessas agendas. Para agir desta forma tem que ter muita ousadia e tem que ter coragem para sair do lugar comum, para se arriscar, para apostar em modelos que não são estabelecidos, porque se queremos um resultado diferente temos que apostar em soluções e caminhos diferentes, neste modelo de atuação que temos apostado aqui no Fundo Vale.
Márcio
E para você Vivian, onde é que “pega”? Quando falamos em gestão de projetos em negócios de impacto, ou seja, de empreendedores que precisam conciliar o impacto social com o resultado financeiro, onde é que “pega” para você?
Vivian
Acho que onde “pega” é justamente é nesta conciliação entre o impacto positivo e o resultado financeiro. No fundo esta é uma tese que está colocada no campo da importância de criar modelos de negócios para resolução dos problemas sociais e ambientais que temos hoje, que são muitos, justamente para a gente também conseguir dar mais escalas. A Márcia trouxe aqui um pouco do desafio de escala, a gente entende que os modelos de negócios têm esta função, mas de alguma forma, conciliar este impacto social com este resultado financeiro ele tem muita implicação do ponto de vista de gestão, porque essa conciliação por si só, ela não é trivial, a gente tem acompanhado muitos negócios que percebemos que as escolhas que os empreendedores de impacto precisam fazer, elas têm sempre estas duas nuances, uma é olhar para o resultado financeiro e a outra olhar para aquilo que está gerando no ponto de vista socioambiental. É muito importante entender isso, essas escolhas, estas definições que precisam ser feitas ao longo do ciclo de vida do projeto de alguma forma elas fazem com que o projeto muitas vezes precise fazer uma séries de mudanças, então o projeto na medida que o negócio de impacto vai entendendo melhor a complexidade do problema que ele precisa lidar, muitas vezes ele vai percebendo quando ele começar a fazer o monitoramento dos impactos que aquela solução que ele tinha buscado, que ele tinha pensado dois anos atrás, já não é suficiente para dar conta de resolver um problema com a complexidade que ele teria. Uns dos modelos que temos discutido bastante e que temos acompanhado no ICE é o modelo do Vivenda, acho que todos conhecem no campo é uma organização bem conhecida que tem trabalhado muito com a questão de reformas em favelas e olhando especialmente para esta questão de inadequação de habitações, especialmente em favelas aqui em São Paulo. Com o tempo, com o aprofundamento do olhar para esta questão da habitação, a Vivenda também foi se colocando e foi experimentando. Teve que pensar em instrumentos financeiros, pensar em uma plataforma tecnológica para dar conta dos seus desafios, teve que pensar em parcerias comerciais, na medida que ela foi se apropriando de tudo isso, o negócio foi se vendo em outro lugar. Eu gosto de trazer este exemplo, porque a gente viu uma grande diferença do que era Vivenda a quatro anos focado nas reformas das favelas, de fato eles ainda continuam. A Vivenda já começa a se posicionar como uma plataforma tecnológica e com soluções financeiras a serviço de outras organizações, porque o modelo Vivenda foi um grande sucesso e a gente começa a ver outras iniciativas muito parecidas e que precisavam percorrer o mesmo caminho, que de alguma forma eles já tinham percorrido. A gente está vendo cada vez mais o Vivenda, por exemplo, se colocando como uma plataforma tecnológica e financeira a serviço destas outras organizações, ou seja, teve uma mudança bastante significativa da forma de atuar daquela organização e de fato quando se toma uma decisão como esta, o empreendedor precisa olhar para o impacto que isso possa gerar, para a escala que isso pode gerar e também para o resultado financeiro dele. Isso tem um impacto muito grande quando a gente olha do ponto de vista de gestão de projetos fazendo um link mais imediato com o tema da nossa conversa, estas mudanças recorrentes no modelo de negócio elas trazem muitas implicações no ponto de vista de equipe, no ponto vista de parcerias necessárias, no ponto de vista orçamentário e que demandam para a organização uma grande capacidade de se reinventar. Acho que onde “pega” quando a gente fala de negócio de impacto é esta necessidade de se reinventar e garantir este equilíbrio entre impacto positivo e resultado financeiro, que é aquilo em que a gente acredita. Como diz a Artemísia: entre mudar o mundo e ganhar dinheiro fique com os dois. Mas essa balança é ainda um desafio e a gente acompanha a trajetória de muitos empreendedores que estão batalhando e buscando recursos para conseguir manter as suas iniciativas de pé.
Márcio.
Muito bem, pessoal nós chegamos ao final da nossa conversa de hoje, neste formato mais longo, mas não menos interessante com tantas vivencias que vocês compartilharam com a gente e foi um prazer receber vocês aqui na nossa roda de conversa a distância.
Obrigado Márcia, um grande abraço respeitando sempre os protocolos de distanciamento, mas um abração para você.
Márcia
Um abraço, foi um prazer poder compartilhar aqui um pouco a experiência do Fundo Vale.
Márcio
Vivian, muito obrigado e um abraço a distância para você também.
Vivian
Obrigada, Márcio, conte com a gente.
Márcio
A gente termina este último encontro especial dentro do PQPS! Talks. Este é o último episódio desta temporada e eu aproveito para fazer um agradecimento para a equipe da Tekoha Alexandra, Andressa, Bárbara, Morgana que participaram dos encontros online a Cris e a Jessica que ficam no administrativo e na comunicação é um prazer enorme fazer parte de uma equipe tão qualificada, tão comprometida e tão divertida. Eu aprendi muito aqui nestes quase vinte episódios nesta jornada, eu tenho muito o que agradecer a cada uma de vocês por toda esta troca que “rolou” este ano.
Este episódio do PQPS! Talks fica por aqui. E se você não ouviu todos os episódios ainda tem mais jornadas PQPS! Pergunta e Questionamentos sobre Projetos Socioambientais nos outros podcasts deste ciclo.
Um forte abraço. Até!
Você ouviu PQPS perguntas e questionamentos sobre projetos socioambientais, uma conversa aberta com quem trabalha com projetos no tempo de desenvolvimento socioambiental parceiros operacionais Aupa e Ponte a Ponte. Apoio financeiro Instituto de cidadania Empresarial. Realização Rede Tekoha acesse mais conteúdos sobre as jornadas PQPS em www.aupa.com.br/pqps
Transcrito por Cristina Cordeiro.