A gente tem se questionado bastante e levantado o tema da gestão ágil em projetos sociais. Parece mais um buzz-word, mais um tema da moda que estamos tentando importar do mundo dos negócios tradicionais e das startups para o campo do impacto social.
Quem conhece a gente, tem certeza que a última coisa que queremos é importar referência inútil para chamar atenção e vender qualquer tipo de serviço ou curso. A gente tem tentado realmente olhar para o que tem acontecido no campo social e buscado soluções para as urgências e para os problemas reais que organizações sociais vivem constante e diariamente. Aqui, também estamos um tanto cansadas de sermos as profissionais que de maneira incansável têm que mudar seus planejamentos a cada mês.
A gente só parou para refletir sobre se não estávamos gastando energia demais com o que tinha que ser desfeito várias vezes. E assim, tentamos olhar um pouco ao redor, um pouco mais distante: os projetos do campo social estão constantemente sendo executados em ambientes complexos, mutáveis e altamente incertos. Sempre. E isso não acontece só às vezes. Todos as vezes é assim. Então, por que é que sempre fazemos planejamentos longuíssimos, como se sua execução fosse acontecer em um ambiente simples, estático e determinado?
Jenga e a agilidade de planejar projetos sociais
Você já jogou Jenga?
É um jogo que dá para jogar até sozinho. 54 bloquinhos de madeira, que formam uma torre de 18 andares, com 3 bloquinhos em cada andar. A cada rodada, um jogador tem que remover um bloquinho de madeira de qualquer lugar abaixo do último andar completo de blocos de madeira, usando apenas uma mão. Depois de retirar o bloco, ele deve colocá-lo sobre a torre. O objetivo do jogo é manter o máximo de rodadas possível a torre de pé.
E o que isso tem a ver com gestão de projetos sociais? Com gestão ágil de projetos sociais?
Quando o jogo começa, não é possível ter certeza de como o jogo vai terminar. A gente consegue imaginar, mas a possibilidade de movimentos é imensa; a incerteza sobre como a torre tornará e como os jogadores moverão as peças, é a única certeza que temos. Pergunto: é possível fazer um planejamento completo do jogo antes mesmo dele começar?
Planejamento em ondas sucessivas
A conexão que podemos fazer entre Jenga e o planejamento ágil de projetos sociais é o conceito de planejamento em ondas sucessivas, o planejamento em ondas curtas. Uma das premissas do planejamento ágil de projetos é a habilidade de planejar a todo o momento olhando e se adaptando às necessidades de cada instante. Estar constantemente atento às mudanças e adaptar-se a elas é crucial para o sucesso do projeto e do atendimento das necessidades do público alvo.
O BID desenvolveu uma ferramenta para fortalecer a capacidade de gerenciamento de projetos de organizações do campo do desenvolvimento social, a PM4R. No seu manual para gestão ágil de projetos sociais, ele faz um questionamento:
“Por que devemos usar uma abordagem de gerenciamento de projetos diferente da já conhecida? A resposta é simples: os projetos precisam de uma abordagem adequada para a situação particular pela qual estão passando. Especialmente aqueles projetos que estão em um ambiente complexo, mutável e altamente incerto.”
PM4R Agile
Mudanças sociais: projetos sociais e suas mudanças
As transformações sociais que os projetos sociais buscas realizar são urgentes. Sabemos disso. Pessoas passam fome, crianças sofrem violências, mulheres estão em situações de vulnerabilidade, populações LGBTQ+ vivem em opressão, doenças trazem dores, a pobreza causa uma infinidade de necessidades hoje que não podem esperar transformações que um dia (sabe-se lá quando, em um futuro…..) serão resolvidas – pessoas poderão estar simplesmente mortas, se esperarmos o dia em que – lá na frente – estará tudo resolvido.
O que nos olhos da história, o objetivo final é a obtenção de um resultado concreto ao final do processo, o desenvolvimento socioeconômico de um país ou região, na prática, é o dia-a-dia. As atividades diárias e os ajustes de rota – todos os dias – são o que fazem com garantimos chegar ao resultado final: à solução do problema social que nos propusemos a resolver.
Mudanças ágeis: por quê?
A gestão ágil em projetos sociais permite que avaliemos diariamente, de maneira interativa e incremental, o projeto em ciclos curtos. Ele dá maior visibilidade aos resultados, em períodos mais curtos de tempo. Não precisamos esperar até o final de todo o processo para ter certeza – ou não – de que o resultado está sendo alcançado.
Implementar esta maneira de gerir projetos não é apenas a utilização de ferramentas digitais ou usar um monte de post-its na parede, ou importar nomes bonitos do mundo das startups para a realidade das organizações sociais. Gestão ágil de projetos sociais representa uma mudança no gerenciamento dos projetos de desenvolvimento social. Representa um exercício constante de atenção para as necessidades do público alvo com quem a organização se propõe a trabalhar e apoiar. É uma mudança – e sabemos que mudanças às vezes cansam! – porque, em particular é uma nova maneira de trabalhar com as pessoas que compõem a equipe do projeto e sua maneira de interagir com todo as partes interessadas.
No final das contas, para que executamos um projeto social? Para o que buscamos atuar por meio de uma organização social? É para solucionar o problema social que o público alvo vive, não é? Assim, o objetivo maior, a “obsessão” primeira da organização e da sua equipe, deve ser colocar no centro de tudo que se faz no projeto buscar a melhor maneira de resolver este problema e buscar ter a menor margem de dúvidas de que o caminho que se está percorrendo é assertivo.